Por Sebastião Feyo de Azevedo*
É com muito prazer que contribuo para o Boletim do
INESC-Porto, pondo no papel alguma da reflexão que vou
fazendo nestes dias a respeito do tema em título.
Escolhi este e não outro tema por razão do momento e da
conjuntura. Saberão os leitores que está em curso uma
discussão da Reforma do Ensino Superior, lançada pelo
Senhor Ministro da Ciência e do Ensino Superior em
documento enviado ao Conselho de Reitores das Universidades
Portuguesas a 16 de Janeiro próximo passado e suscitada
pelo nosso Reitor na sua mensagem de 17 de Janeiro aos
docentes e investigadores da Universidade do Porto. Já
enviei ao Senhor Ministro e ao Senhor Reitor a minha
contribuição para essa discussão, relativamente à qual
este documento representa um resumo.
Como o espaço é curto pareceu-me adequado
compartimentar a reflexão em grupos de tópicos; ora,
obviamente que esses comentários espartilhados só no seu
conjunto, com integração das ideias, dão alguma resposta
sustentada ao objecto que pretendo atingir.
Comecemos pelo necessário enquadramento de referências
de identidade e qualidade:
§ Portugal é um país Europeu e toda e qualquer
apreciação só pode ser feita na perspectiva de
referenciais Europeus.
§ Para quem conhece a Europa, não há nenhuma razão para
não acreditar, ou melhor há indicadores bastantes para
acreditar na nossa absoluta capacidade para nos afirmarmos
competitivamente como parceiros iguais na União.
§ É bem claro que a Universidade e o Ensino Superior
não estiveram estáticos nos últimos 30 anos. Longe disso.
A questão está em ajuizar se essa evolução real foi ou
tem sido aquela que deveriamos ter tido e que podemos e
temos que ter para responder ao nosso papel histórico na
Europa. A resposta ou constatação é que temos que
continuar o esforço de adaptação aos tempos modernos e
às novas exigências da ordem internacional.
§ Numa perspectiva global, esta reforma necessária e
desejada prende-se e e enquadra-se em duas das grandes
problemáticas reformistas com que Portugal se debate hoje:
primeiro, a necessária reforma institucional colectiva;
depois, ou igualmente, uma não menos necessária reforma
comportamental individual.
§ São cinco as grandes áreas de intervenção
reformista no ensino superior: (i) definição rigorosa de
organização institucional e de missão das várias
instituições de ensino e de investigação; (ii)
adaptação estrutural e curricular em conformidade com as
directrizes europeias de Bolonha; (iii) reforma do sistema
de gestão; (iv) reforma dos pressupostos do sistema de
financiamento; e (v) reforma e implementação séria de
estatutos de carreira profissional.
Eis então algumas questões e direcções de
desenvolvimento que no meu entendimento devem ser resolvidas
e/ou consagradas:
§ Em termos de estruturas de formação e de cursos, é
necessário concretizar a reflexão já efectuada sobre
Bolonha: definir estrutura, duração e características de
cursos.
§ Entronca a questão anterior com a da missão das
Instituições. Em particular, nas engenharias é
necessário ultrapassar definitivamente o problema latente
Universidade-Politécnicos. O que, reconheça-se, é um
problema que exige muita força e coragem políticas porque
não vejo um acordo fácil entre os actores.
§ Para lá dos Bacharelatos e Mestrados, o País precisa
de cursos médios, tecnológicos, de formação de quadros
intermédios virada para a aplicação. Os Politécnicos
devem assegurar este tipo de cursos.
§ É necessário definir de forma clara a relação
institucional, hierárquica e funcional, entre as Unidades e
Instituições de Investigação e as Unidades Orgãnicas
das Universidades. Esta questão traduz-se simbolicamente na
seguinte pergunta:
o Será razoável que um Director de uma Faculdade não
possa reportar, por falta de informação, sobre a
actividade de investigação dos seus membros do Corpo
Docente e Investigador?
§ Relativamente aos Institutos de Investigação, com
personalidade jurídica, dever-se-á estabelecer um conjunto
de regras que balizem contratos-programa de actividades que
de forma transparente definam os níveis de envolvimento dos
activos da Unidade Orgânica das Universidades, a esfera de
actuação, nomeadamente em fornecimento de serviços
docentes de graduação e de pós-graduação e os níveis
de orçamentos, com a devida consideração bi-direccional
de recursos.
§ Com o desenvolvimento, particularmente com o aumento
significativo dos meios humanos envolvidos, do investimento
e de custos de funcionamento, é crescente a inadequação e
ineficiência do sistema de gestão
administrativo-financeira das instituições públicas do
ensino superior. :
§ Continuamos, à semelhança da gestão, com um
estatuto de carreira que de facto não define o que deve
definir, não exige o que deve exigir, não promove o que
deve promover, não impede o que deve impedir e não
compensa o que deve compensar.
§ Por força conjugada das circunstâncias anteriores,
em larga medida a Sociedade vê a profissão universitária
como uma profissão em tempo parcial, tal como aliás
bastantes em falso tempo integral a praticam.
§ O financiamento é questão material que se relaciona
horizontalmente com as questões da missão das
instituições (geração de receitas próprias) e com a
organização pedagógica e científica.
Epílogo
Em duas páginas, é isto. Dava para escrever um livro e
ainda sobravam assuntos.
Como sempre ao longo da história, situações difíceis
geram simultaneamente esperança, na medida em que criam
condições para acção e mudança, condições de combate
ao laxismo, à permissividade e à impunidade, problemas
cíclicos das Sociedades democráticas contemporâneas, que
não só, mas também de Portugal.
Condições que devem ser aproveitadas...
*
Professor Catedrático; Director do
Departamento de Engenharia Química da FEUP; Director do
Curso de Licenciatura em Engenharia Química da FEUP;
Director do Curso de Mestrado em Automação,
Instrumentação e Controlo da FEUP; Coordenador Científico
da Unidade de I&D Instituto de Sistemas e
Robótica-Porto; Director Nacional do Instituto de Sistemas
e Robótica; Membro do Conselho de Admissão e
Qualificação da Ordem dos Engenheiros; Membro do Grupo de
Trabalho em Educação em Engenharia Química da Federação
Europeia de Engenharia Química; Membro da Direcção da
EUCA-European Union Control Association