Por Luís Teixeira *
"Todos
os meios são sensatos. Apenas o meu objectivo é desvairado."
Herman
Melville, Moby Dick
Nos últimos dois anos, além de trabalhar com novos
investigadores tenho participado em programas ao abrigo dos
quais, na UTM, temos recebido investigadores estrangeiros
por períodos de 1 a 2 anos.
Um dos desafios que se coloca é transmitir aos novos
colaboradores o conhecimento sobre como a nossa empresa age
e/ou reage às inúmeras mudanças estratégicas, políticas e
organizacionais que ocorrem com o tempo. A esta minha
demanda por uma definição “simples” do que é o INESC tenho
acumulado as minhas observações das empresas/instituições
com que tenho trabalhado. É esta reflexão que eu gostaria de
partilhar.
Pessoalmente gosto de considerar as empresas, a.k.a o
INESC, como um organismo vivo e dinâmico e que existe dentro
de outros sistemas vivos maiores, neste caso o ecossistema e
a sociedade. Para os sistemas serem saudáveis, tem de haver
reciprocidade entre estes.
Esta é a condição básica de qualquer sistema natural. Por
exemplo, a SIDA é um sistema vivo que destrói o seu hóspede,
um sistema vivo muito maior. Depois de um tempo, a SIDA
acaba, porque dura até que acaba com a viabilidade do outro
maior. É assim que maior parte das empresas actua hoje em
dia.
A Sociedade está a convergir na direcção de uma economia
do conhecimento, onde os elementos decisivos da vantagem
competitiva não estão mais na posse, na detenção dos bens
físicos, nos recursos. Pelo contrário, assentam de modo
crescente na capacidade de gerar, partilhar e integrar
conhecimentos. De uma estratégia de conquista de posições,
preserváveis por períodos temporais longos, está-se a
evoluir para uma estratégia de movimento, baseada na
capacidade de antecipar tendências e de acompanhar
rapidamente a sua evolução.
Se aceitarmos o princípio da competição, então a
capacidade de uma organização em se transformar e evoluir
permanentemente transforma-se na chave do sucesso. As
empresas que sobrevivem a longo prazo são aquelas que têm
uma grande capacidade para repensarem-se e questionarem-se
regularmente. Ao procederem deste modo, as empresas criam e
dominam novas fontes de conhecimento e não se contentam em
defender o que adquiriram anteriormente.
Neste quadro a gestão da mudança é uma prioridade. Os
sistemas vivos mudam sempre. Enquanto que a intenção
estratégica fundada sobre os recursos supõe a perseguição
linear de um objectivo de longo prazo, a era da
transformação necessita de uma organização capaz de
perseguir objectivos que mudam, e de se reposicionar
rapidamente no tempo. Mesmo o próprio planeamento
estratégico torna-se instável, só sendo permanente a
mudança. A empresa deve ser comparada um ser vivo, que muda
e evolua constantemente.
Inovar é fazer coisas diferentes ou de outra maneira. É
sair do quotidiano e experimentar novas formas de solucionar
problemas. É usar a criatividade para satisfazer
necessidades não satisfeitas ou insuficientemente
satisfeitas.
Ao falar-se de inovação, em particular inovação
tecnológica, faz-se geralmente uma associação às unidades de
investigação importantes que efectuam actividades de I&D com
o objectivo de conceber e desenvolver novas teorias,
processos avançados e consequentemente produtos inovadores.
E argumenta-se frequentemente que não conseguimos inovar
porque o investimento em I&D não é suficiente. Este
argumento, na minha opinião é apenas parcialmente verdade.
Uma das principais razões prende-se com a rigidez das
organizações. Nesta perspectiva, a mudança é conduzida a
partir de cima: quando chega um novo coordenador, este
informa cada trabalhador do seu novo papel e depois espera
pela mudança. Alguns processos podem mudar desta forma, mas
não são mudanças profundas.
A mudança liderada do topo pode gerar alguma energia, mas
é como uma onda que morre na praia, porque cria uma atitude
complacente na organização: a iniciativa tem que vir sempre
de cima. No entanto, a verdadeira aprendizagem acontece no
dia-a-dia, pelas acções que as pessoas executam e nas redes
de relações que constroem. Todavia, a aprendizagem depende
do nível de compromisso das pessoas e das interpretações que
fazem das coisas. Não se pode mudar uma mentalidade, mas
pode-se, com tempo, cultivar uma nova.
É urgente que a direcção das empresas encontrem formas de
equilibrar o processo de mudança com equipas locais nas
várias camadas da organização, adicionando apenas alguma
coordenação no processo. Claro, que isto depende muito da
solidez das relações estabelecidas na empresa. Um clima de
confiança numa organização constrói-se através da
aprendizagem e colaboração conjunta (que requer
necessariamente compromisso entre as diferentes partes).
Para que tal aconteça, as pessoas têm que possuir
autoconsciência do seu pensamento e questionar continuamente
as suas assunções. Competências como estas necessitam de ser
desenvolvidas ao longo do tempo.
É necessário apostar na formação em «competências-chave»,
isto é, as competências não técnicas, que mobilizam diversos
tipos de saber, que fazem apelo a aspectos psicológicos -
cognitivos e afectivos -, a saberes sociais, tais como os
conhecimentos do meio profissional e as normas das
organizações e ainda a saberes sociológicos e culturais.
Em resumo apostar em saberes como comunicação, trabalhar
em grupo, responsabilidade, sentido de organização,
autonomia, flexibilidade e polivalência de funções. Convém
relembrar as duas alavancas da mudança estratégica numa
organização: desenvolvimento de massa crítica (abordagem
bottom-up) e alterações estratégicas (abordagem top-down).
* Colaborador da Unidade de
Telecomunicações e Multimédia (UTM)
O CONSULTOR DO LEITOR COMENTA
Caro Luís, a adaptação ao meio e a introdução de mutações
são os mecanismos que a mão morta de Charles Darwin agita
para garantir a sobrevivência dos indivíduos e a evolução
das espécies.
A analogia com os organismos sociais é tentadora - e pode
ser esclarecedora. Por isso me agradou ir lendo a tua prosa.
E concordo: o INESC, para sobreviver como conceito, tem
que se ir mutando. Com esclarecimento, evoluirá num sentido
que assegure maximização da probabilidade de sobrevivência
num contexto também mutante.
Neste processo de metamorfose, a emergência de lideranças
é o factor chave. As lideranças, no nosso meio, necessitam
em simultâneo de competências técnicas e em outros saberes,
como os que enuciaste.
Nós temos um enorme défice de lideranças. Seria
interessante discutir:
a) se a essência cultural feupista, ou mesmo nacional,
que nos permeia, é avessa à potenciação de uma tal vocação,
ou
b) se a maioria das pessoas não são mesmo capazes, ou
c) se a estrutura inesquiana tem rigidez estrutural que
abafa a emergência das lideranças.
Que achas?
A verdade é que estamos num momento CRÍTICO de
redefinição do rumo do INESC Porto. Este ano de 2003,
acentuou-se dramaticamente uma tendência de redução da
actividade contratada de prestação de serviços, face a
actividade financiada de projectos. Como os projectos nunca
são financiados a 100%, caminhamos para o desastre.
Precisamos de lideranças que se evidenciem pela sua
iniciativa. E precisamos que algumas delas agarrem as
oportunidades do mercado e multipliquem a oferta do INESC
Porto em consultoria e prestação de serviços.
Abriremos todo o espaço, repito, todo o espaço a
iniciativas com este objectivo.
Tens ideias para gerar e acarinhar estas vocações? Tens
ideias para firmar o INESC Porto como um “grande consultor”
em vários mercados e áreas do saber?
Queres agir, já?
(“não perguntes o que a Direcção pode fazer por ti,
pergunta o que podes fazer pelo INESC”- esta é velha, está
trucidada, mas ainda inspira...)