B o l e t i m Número 59 de Fevereiro 2006 - Ano VI

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E D I T O R I A L

 

A CIÊNCIA NO QUOTIDIANO DOS VALORES

 

Há uma revolução surda e lenta a processar-se em Portugal.

Atravessamos nos últimos tempos mares cinzentos, céus de chumbo e marés de pessimismo. Parece que o pessimismo é um sistema social de realimentação positiva e o que parece, é, nestas matérias.

Pois nós, no INESC Porto, temos o dever e a missão de nos mantermos optimistas. Porque o optimismo é também, em Portugal, um sistema social de realimentação positiva que, quando descontrolado, conduz à euforia - mas, nos tempos que correm, bom uso daríamos a um pouco de euforia, para variar.

Acontece que os sinais estão aí, diante de nós mas, provavelmente por isso, por excesso de convívio, não os apercebemos: há uma revolução surda e lenta a processar-se em Portugal.

A presença da ciência nos meios de comunicação social passou, de infinitesimal há uma década atrás para secção obrigatória nos periódicos de maior prestígio, de enlatados estrangeiros nas tvs para programas de fundo sobre ciência portuguesa nos canais de emisão generalista.

A presença da ciência no verbo dos decisores, dos políticos, está a deixar de ser uma vírgula ou uma nota de pé de página.

A presença da ciência, da existência de ciência, em Portugal, está a passar, no discurso público, de grande ausente para referência necessária.

A realidade mais transformante é a realidade social - o estatuto socialmente atribuído à ciência e aos cientistas (palavra que ainda há anos era quase maldita!, aplicava-se a estrangeiros mas não a portugueses, classificados pudicamente como meros investigadores) não tem cessado de se dignificar aos olhos dos cidadãos. O estatuto social de quem se dedica à ciência e, por arrasto, à tecnologia levou subidas de maré.

Portugal é o único país da Europa dos 15 em que a procura, no Secundário, de cursos tecnológicos aumentou em vez de diminuir. É certo que temos muita margem para crescer em matéria de formação universitária, aqui o que interessa é a derivada.

Estamos a educar gerações nessa visão da sociedade e dos seus factores de importância relativa. Essas gerações educarão os filhos nessa visão: na da ciência inserida no quotidiano dos valores.

Isto necessariamente há-de ter consequências.

Há um optimismo surdo e lento a avançar em nós, só falta darmos conta dele, porque ele está aí.



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